quarta-feira, 27 de maio de 2009

Divulgação da interessante e rica entrevista concedida a jornalista italiano por sociólogo brasileiro premiado na Itália

O sociólogo brasileiro Cândido Grzybowski, um dos idealizadores do Forum Social Mundial, acaba de receber, na Itália, prêmio no Festival Internacional de Jornalismo.

Na sede do Arci, onde participou de uma reunião da coordenadoria italiana pelo Forum Social Mundial, foi entrevistado pelo jornalista italiano Giuliano Battiston. Na entrevista fala de globalização, neoliberalismo e lança propostas construtivas ao social. Segundo Grzybowski, é preciso aproveitar o espaço político aberto com a crise econômica, para construir alternativas "que reforcem a autonomia e, ao mesmo tempo, a complementariedade dos povos".

Para mudar as características da globalização neoliberal, "que domina as diversidades e as torna desigualdades estruturais", é preciso "aglutinar forças", aproveitando este momento para reconquistar a autonomia dos cidadãos e das cidadãs em relação aos poderes estatais e à economia de mercado.

Torna-se necessário opor ao individualismo difundido e praticado pelo modelo neoliberal uma nova cidadania global que tenha origem nas batalhas sociais e esteja em condição de fortalecer as diversidades dos sujeitos coletivos, assegurando para todos o direito de participar da "coisa" pública.

Para Grzybowski, "a democracia pode se tornar um grave risco, se limitada ao formalismo da representação, incapaz de gerar uma sociedade fundada sobre a cidadania ativa". Para isso, é "preciso pensar de forma audaz, muito audaz, e construir sem medo um novo imaginário".

Abaixo, sua interessante entrevista, traduzida por Laura Burocco.

Para os “altermundialistas”, a crise financeira representa uma oportunidade de se livrar do atual sistema político-econômico e desenhar uma arquitetura inclusiva das relações internacionais. Para você, também representa um risco. Recentemente escreveu que “se não conseguirmos aproveitar esta ocasião histórica para dar forma a uma verdadeira democracia global, teremos que enfrentar uma reencarnação do pior capitalismo, pior do que o atual”. Quais instrumentos sugere adotar para transformar riscos em oportunidades?

Cândido A crise demonstra que o sistema não é sustentável e não funciona, mas para ter clareza das prioridades e rumos a percorrer precisamos de reflexão estratégica: a crise abre as portas, mas não indica as estradas nem oferece as ferramentas para edificar um novo sistema. Estes instrumentos devem ser construídos. Os que sustentam o modelo neoliberal e os governos que aderiram a ele não têm ideias para propor, discutem apenas as formas para evitar que algo pior aconteça. Os movimentos sociais parecem orientados na mesma direção. A questão do trabalho é central, mas estamos correndo o risco de esquecer que antes da crise não havia trabalho garantido para todos. Quem está preocupado com a população mundial que nunca teve emprego, que antes da crise não tinha perspectiva de ter e que agora pode ver a sua situação piorar?

Soluções simples não existem, mas, exatamente por isso temos que trabalhar com mais determinação, para reunir forças e capacidades, fechar alianças e refletir, especialmente na base dos aprendizados dos movimentos indígenas da América Latina e do Sul. Temos que reconhecer a necessidade de descolonizar as nossas mentes.

Até agora, para criticar o capitalismo e os seus efeitos, utilizamos categorias do marxismo que, de alguma forma, sugeria a ideia de que, com o incremento das capacidades industriais, poderíamos obter sociedades melhores e mais justas. Mas logo percebemos que o sistema industrial, com o seu “produtivismo”, é parte do problema, não das soluções. Por isso, precisamos recomeçar a pensar: edificar uma nova ciência, direcionar de forma diferente as tecnologias, retomar a pesquisa científica especializada, dar foma a um novo modelo de sociedade. Trata-se de uma mudança que requer tempo, mas uma democracia global real que quer ser inclusiva, com negociação e participação, caminha exatamente deste modo: criando novas condições mais do que indicando percursos específicos.

A crise produz novos conflitos sociais que poderiam atingir populações mais amplas. Num ensaio escrito pela rede de ativistas Euralat, “Liberdade e igualdade com afirmação da diversidade”, você afirma que “os conflitos e as batalhas têm um potencial destruidor e construtor. Qual dos dois prevalece depende da forma como são conduzidos e direcionados”. O que devemos fazer para promover conflitos que sejam construtivos e não se reduzam à demanda de mudanças apenas de fachada?

Cândido Focalizar as energias em torno de um programa político, exercitando os instrumentos de engenharia política. Você deve conhecer Gramsci, um dos estudiosos que, com lucidez, refletiu sobre as formas através das quais o poder estabelece hegemonia e imprime “direção” política aos eventos. Neste sentido, precisamos dar sentido aos conflitos. As mudanças estruturais acontecem especialmente nas esferas econômica e estatal, mas dependem, em primeiro lugar, dos cidadãos e cidadãs. Na história sempre foi assim. O Estado não possui por si força dinâmica para mudar; são os cidadãos que levam o Estado à mudança.

A mesma coisa vale para a economia, que deve sempre ser reinventada e que hoje deve ser subordinada ao bem comum coletivo. Os conflitos atuais devem ser examinados com extrema atenção: podemos “banalizar” as energias que o expressam, despotencializa-las, até destrui-las, ou deixar que se tornem um novo fascismo. Para fugir a isso, precisamos aprender com a história: as instituições são, na maioria, inadequadas para responder aos desafios globais. Até porque respondem a lógicas de caráter nacional. Frente a estes desafios, precisamos de novas estratégias integradas, de natureza regional, através das quais poderemos construir plataformas que vão além dos limites dos Estados-nação. É um caminho difícil, porque vai contra cinco séculos de construção e de consolidação dos Estados, mas é necessário, especialmente hoje.

Entre os vários projetos que o Ibase gerencia, existem dois particularmente significativos: “Agenda pós–neoliberal: alternativas estratégicas por um desenvolvimento democrático e sustentável” e “Diálogos entre os povos”. Acredita que a integração regional de tipo cultural e social é uma alternativa ao modelo neoliberal?

Cândido Os mais poderosos atores econômicos, como as multinacionais, usam as divisões para ir contra as necessidades das pessoas e esconder a natureza “comum”, dos recursos. Por isso, o regionalismo é indispensável. Temos o exemplo da Amazônia, um bem comum dividido por nove nações e por um número ainda maior de povos. Praticamente todos os povos indígenas da América Latina têm laços com a Amazônia, povos que muitas vezes vêem na autoridade do Estado uma nova forma de colonialismo. Para que a autonomia deles possa ser preservada e seja possível edificar Estados realmente pluralistas, precisamos de uma estratégia em escada regional: sozinhos, estes povos não teriam condições de resistir às pressões externas.

Gostaria que se falasse mais de regionalização do que de integração. Este último é um termo de origem comercial: as grandes infra-estruturas que cruzam a América Latina, como veias abertas (expressão de Eduardo Galeano), refletem este modelo. É suficiente pensar nas artérias comerciais destinadas à extração minerária. O regionalismo, pelo contrário, não precisa de infra-estruturas, mas de comunicações de culturas, experiências e povos. Apenas através de uma comunicação deste tipo, será possível, finalmente, reconhecer a reciprocidade dos direitos, dar forma a uma diferente visão de mundo, criar projetos, elaborar sonhos.

Antes ainda das indicações técnicas, precisamos transformar os nossos projetos em um grande movimento de idéias que tome conta da sociedade e se torne uma reivindicação cultural, um pedido de mudança. Um requerimento radical que, na hora que está sendo expresso, demonstra a sua possibilidade de ser realizado: a confiança nas possibilidades de mudar as coisas pode transformar os conflitos em forças construtivas.

Você é um dos protagonistas e organizadores do Fórum Social Mundial. A última edição, em Belém, no Brasil, contou com a presença de cinco presidentes de países latino-americanos (Lula, Morales, Correa, Hugo, Chávez). Em uma entrevista a Alejandro Kirk, da International Press Service, você afirmou que o Fórum Social Mundial por si mesmo não produz “a virada” à esquerda na América Latina, mas acrescenta que “se não tivesse acontecido, teria sido difícil imaginar” uma tal virada. Pode nos explicar melhor?

Cândido Queria afirmar que a virada à esquerda é fortemente ligada à atmosfera criada pelas demandas de mudanças levantadas pelos movimentos sociais. Assim como estava falando pouco antes, são “as idéias que atravessam a sociedade” que levam a política numa determinada direção. Politicamente, foi importantíssimo que os cinco presidentes tenham participado do mesmo evento. Mas o elemento mais relevante apareceu no discurso de Lula, na hora que ele afirmou que os presidentes estavam reunidos em Belém graças à nós, aos diferentes grupos sociais. Foi um reconhecimento explícito da força dos movimentos sociais. Por um lado, nos convida a ir em frente, experimentar novas práticas e buscar novas soluções não ortodoxas. Por outro, coincide com uma inegável vantagem política em relação à crise. Tomando como exemplo a Europa: há algum líder político que esteja em condição de articular uma ideia digna deste nome? Alguém que pense realmente em alternativas?

Em relação a Lula: quando foi eleito pela primeira vez, você afirmou que, com a sua vitória, “os pobres, os que foram marginalizados, os trabalhadores poderiam se tornar a força propulsora na reconstrução da nação”. Num ensaio do 2007, «Which Brazil does the world need?», escreveu: “precisamos reconhecer que o ciclo de renovação democrática inaugurado com a batalha contra a ditatura se esgotou”. Qual seria o “outro Brasil” que a democracia brasileira teria que construir e como avalia hoje o governo Lula?

Cândido Lula é a melhor coisa que o processo de democratização brasileiro poderia produzir. Mas não é bastante. Representa o fim de uma certa época da nossa história, precisamos de um novo início. O Brasil saindo da ditadura militar criou um sistema formalmente democrático, mas perdeu a ocasião de desenvolver uma democracia realmente inclusiva. Estima-se que cerca da metade da população brasileira não está politicamente organizada, não possui “identidade” política.

O outro Brasil que precisamos construir é um país capaz de levar estas pessoas à arena pública, torná-las sujeitos políticos que exercitam os próprios direitos e que, assim fazendo, contribuem para a afirmação de uma nova onda de ativismo social.

Mas é preciso também voltar a refletir sobre o modelo de desenvolvimento. Neste campo, há um déficit de análise como se a democracia formal fosse suficiente para obter a mudança no desenvolvimento. Pelo contrário, há a necessidade de alternativas reais, de uma reflexão democrática sobre como construir uma outra economia. A atual não pode ser democratizada, porque não foi pensada pela democracia e não pertence à democracia. Acho que é necessário passar por uma localização da economia para torná-la democrática: todos nós vivemos em um lugar particular, temos um “endereço”, somos “territorializados". Os atores econômicos, pelo contrário, a maioria das vezes, não são. Deveremos procurar atribuir um endereço para eles também.

Para os “altermundialistas”, a crise financeira representa uma oportunidade de se livrar do atual sistema político-econômico e desenhar uma arquitetura inclusiva das relações internacionais. Para você, também representa um risco. Recentemente escreveu que “se não conseguirmos aproveitar esta ocasião histórica para dar forma a uma verdadeira democracia global, teremos que enfrentar uma reencarnação do pior capitalismo, pior do que o atual”. Quais instrumentos sugere adotar para transformar riscos em oportunidades?

Cândido A crise demonstra que o sistema não é sustentável e não funciona, mas para ter clareza das prioridades e rumos a percorrer precisamos de reflexão estratégica: a crise abre as portas, mas não indica as estradas nem oferece as ferramentas para edificar um novo sistema. Estes instrumentos devem ser construídos. Os que sustentam o modelo neoliberal e os governos que aderiram a ele não têm ideias para propor, discutem apenas as formas para evitar que algo pior aconteça. Os movimentos sociais parecem orientados na mesma direção. A questão do trabalho é central, mas estamos correndo o risco de esquecer que antes da crise não havia trabalho garantido para todos. Quem está preocupado com a população mundial que nunca teve emprego, que antes da crise não tinha perspectiva de ter e que agora pode ver a sua situação piorar?

Soluções simples não existem, mas, exatamente por isso, temos que trabalhar com mais determinação para reunir forças e capacidades, fechar alianças e refletir, especialmente, na base dos aprendizados dos movimentos indígenas da América Latina e do Sul. Temos que reconhecer a necessidade de descolonizar as nossas mentes.

Até agora, para criticar o capitalismo e os seus efeitos, utilizamos categorias do marxismo que, de alguma forma, sugeria a ideia de que, com o incremento das capacidades industriais, poderíamos obter sociedades melhores e mais justas. Mas logo percebemos que o sistema industrial, com o seu “produtivismo”, é parte do problema, não das soluções. Por isso, precisamos recomeçar a pensar: edificar uma nova ciência, direcionar de forma diferente as tecnologias, retomar a pesquisa científica especializada, dar foma a um novo modelo de sociedade. Trata-se de uma mudança que requer tempo, mas uma democracia global real que quer ser inclusiva, com negociação e participação, caminha exatamente deste modo: criando novas condições mais do que indicando percursos específicos.

A crise produz novos conflitos sociais que poderiam atingir populações mais amplas. Num ensaio escrito pela rede de ativistas Euralat, “Liberdade e igualdade com afirmação da diversidade”, você afirma que “os conflitos e as batalhas têm um potencial destruidor e construtor. Qual dos dois prevalece depende da forma como são conduzidos e direcionados”. O que devemos fazer para promover conflitos que sejam construtivos e não se reduzam à demanda de mudanças apenas de fachada?

Cândido Focalizar as energias em torno de um programa político, exercitando os instrumentos de engenharia política. Você deve conhecer Gramsci, um dos estudiosos que, com lucidez, refletiu sobre as formas através das quais o poder estabelece hegemonia e imprime “direção” política aos eventos. Neste sentido, precisamos dar sentido aos conflitos. As mudanças estruturais acontecem especialmente nas esferas econômica e estatal, mas dependem, em primeiro lugar, dos cidadãos e cidadãs. Na história sempre foi assim. O Estado não possui por si força dinâmica para mudar; são os cidadãos que levam o Estado à mudança.

A mesma coisa vale para a economia, que deve sempre ser reinventada e que hoje deve ser subordinada ao bem comum coletivo. Os conflitos atuais devem ser examinados com extrema atenção: podemos “banalizar” as energias que o expressam, despotencializa-las, até destrui-las, ou deixar elas se tornarem um novo fascismo. Para fugir a isso, precisamos aprender com a história: as instituições são, a maioria, inadequadas para responder aos desafios globais. Até porque respondem a lógicas de caráter nacional. Frente a estes desafios, precisamos de novas estratégias integradas, de natureza regional, através das quais poderemos construir plataformas que vão além dos limites dos Estados-nação. É um caminho difícil, porque vai contra cinco séculos de construção e de consolidação dos Estados, mas é necessário, especialmente hoje.

Entre os vários projetos que o Ibase gerencia, existem dois particularmente significativos: “Agenda pós–neoliberal: alternativas estratégicas por um desenvolvimento democrático e sustentável” e “Diálogos entre os povos”. Acredita que a integração regional de tipo cultural e social é uma alternativa ao modelo neoliberal?

Cândido Os mais poderosos atores econômicos, como as multinacionais, usam as divisões para ir contra as necessidades das pessoas e esconder a natureza “comum”, dos recursos. Por isso, o regionalismo é indispensável. Temos o exemplo da Amazônia, um bem comum dividido por nove nações e por um número ainda maior de povos. Praticamente todos os povos indígenas da América Latina têm laços com a Amazônia, povos que muitas vezes vêem na autoridade do Estado uma nova forma de colonialismo. Para que a autonomia deles possa ser preservada e seja possível edificar Estados realmente pluralistas, precisamos de uma estratégia em escada regional: sozinhos, estes povos não teriam condições de resistir às pressões externas.

Gostaria que se falasse mais de regionalização do que de integração. Este último é um termo de origem comercial: as grandes infra-estruturas que cruzam a América Latina, como veias abertas (expressão de Eduardo Galeano), refletem este modelo. É suficiente pensar nas artérias comerciais destinadas à extração mineraria. O regionalismo, pelo contrário, não precisa de infra-estruturas, mas de comunicações de culturas, experiências e povos. Apenas através de uma comunicação deste tipo, será possível, finalmente, reconhecer a reciprocidade dos direitos, dar forma a uma diferente visão de mundo, criar projetos, elaborar sonhos.

Antes ainda das indicações técnicas, precisamos transformar os nossos projetos em um grande movimento de idéias que tome conta da sociedade e se torne uma reivindicação cultural, um pedido de mudança. Um requerimento radical que, na hora que está sendo expresso, demonstra a sua possibilidade de ser realizado: a confiança nas possibilidades de mudar as coisas pode transformar os conflitos em forças construtivas.

Você é um dos protagonistas e organizadores do Fórum Social Mundial. A última edição, em Belém, no Brasil, contou com a presença de cinco presidentes de países latino-americanos (Lula, Morales, Correa, Lugo, Chávez). Em uma entrevista a Alejandro Kirk, da International Press Service, você afirmou que o Fórum Social Mundial por sim mesmo não produz “a virada” à esquerda na América Latina, mas acrescenta que “se não tivesse acontecido, teria sido difícil imaginar” uma tal virada. Pode nos explicar melhor?

Cândido Queria afirmar que a virada à esquerda é fortemente ligada à atmosfera criada pelas demandas de mudanças levantadas pelos movimentos sociais. Assim como estava falando pouco antes, são “as idéias que atravessam a sociedade” que levam a política numa determinada direção. Politicamente, foi importantíssimo que os cinco presidentes tenham participado do mesmo evento. Mas o elemento mais relevante apareceu no discurso de Lula, na hora que ele afirmou que os presidentes estavam reunidos em Belém graças à nós, aos diferentes grupos sociais. Foi um reconhecimento explícito da força dos movimentos sociais. Por um lado, nos convida a ir em frente, experimentar novas práticas e buscar novas soluções não ortodoxas. Por outro, coincide com uma inegável vantagem política em relação à crise. Tomando como exemplo a Europa: há algum líder político que esteja em condição de articular uma ideia digna deste nome? Alguém que pense realmente em alternativas?

Em relação a Lula: quando foi eleito pela primeira vez, você afirmou que, com a sua vitória, “os pobres, os que foram marginalizados, os trabalhadores poderiam se tornar a força propulsora na reconstrução da nação”. Num ensaio do 2007, «Which Brazil does the world need?», escreveu: “precisamos reconhecer que o ciclo de renovação democrática inaugurado com a batalha contra a ditatura se esgotou”. Qual seria o “outro Brasil” que a democracia brasileira teria que construir e como avalia hoje o governo Lula?

Cândido Lula é a melhor coisa que o processo de democratização brasileiro poderia produzir. Mas não é bastante. Representa o fim de uma certa época da nossa história, precisamos de um novo início. O Brasil saindo da ditadura militar criou um sistema formalmente democrático, mas perdeu a ocasião de desenvolver uma democracia realmente inclusiva. Estima-se que cerca da metade da população brasileira não está politicamente organizada, não possui “identidade” política.

O outro Brasil que precisamos construir é um país capaz de levar estas pessoas à arena pública, torná-las sujeitos políticos que exercitam os próprios direitos e que, assim fazendo, contribuem para a afirmação de uma nova onda de ativismo social.

Mas é preciso também voltar a refletir sobre o modelo de desenvolvimento. Neste campo, há um déficit de análise como se a democracia formal fosse suficiente para obter a mudança no desenvolvimento. Pelo contrário, há a necessidade de alternativas reais, de uma reflexão democrática sobre como construir uma outra economia. A atual não pode ser democratizada, porque não foi pensada pela democracia e não pertence à democracia. Acho que é necessário passar por uma localização da economia para torná-la democrática: todos nós vivemos em um lugar particular, temos um “endereço”, somos “territorializados” . Os atores econômicos, pelo contrário, a maioria das vezes, não são. Deveremos procurar atribuir um endereço para eles também.

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